1.4.07

Só porque há dias assim


Depois da conversa começou a suspirar. Quando lhe perguntei o que tinha, disse-me que estava a controlar o estado dos pulmões depois de fumar três cigarros. Só fumava quando estava comigo, disse-mo para me fazer sentir mal pela maldade das minhas palavras anteriores. Me encantas, pero como amigo, não é coisa que se diga a quem gosta de nós. Deixei-o suspirar mais umas vezes e não lhe enrolei mais nenhum cigarro até se começar a comportar como aquilo que eu queria que ele fosse,desde há tanto tempo, quanto, meses?, um amigo, e naquele dia eu precisava de um amigo a sério que me perguntasse porque é que eu estava tão tensa e me dissesse pára de te coçar, mujer, e no fim da noite me abraçasse, só porque há dias assim. O café acabou por se tornar num jantar e em mais uma cerveja que tive de ser eu a pagar porque já se lhe tinham acabado as moedas, ai, estes homens pindéricos, pois eu precisava de falar, e de chorar se fosse o caso, mas não foi, é que eu só consigo chorar quando não está ninguém a ver, como no outro dia em que me levantei da secretária, disse que já vinha, fechei-me numa sala, sentei-me numa cadeira e, com toda a calma do mundo, comecei a chorar, primeiro devagar, depois com força, tanto até me doerem os olhos, e depois de algum tempo de tristeza profunda, limpei-me às mangas da camisa, esperei que o rubor da emoção passasse, levantei-me, arrumei a cadeira, apanhei um papelinho do chão, deitei-o no lixo e, com a calma com que havia entrado na sala, saía agora e voltava a sentar-me na secretária, tudo isto sem uma palavra, apenas um esfregãozinho nas costas passados dez minutos, que os alemães têm modos estranhos de mostrar compaixão. Ainda me perguntou se queria tirar o resto do dia, mas eu, que já me tinha passado o desespero, lembrei-a de que ali era eu quem perguntava essas coisas aos outros, e começámo-nos a rir. A rir, como quando cheguei a casa depois do abraço desinteressado e li um e-mail de outro amigo que também não se contenta só com isso, mesmo depois de tanto tempo, quanto, um ano?, que me conta de uma suposta apaixonada e, como que me passando um ultimato, se não queres, há quem queira, me pergunta se devia ser um daqueles cabrões que vão para a cama com uma mulher só porque há dias assim. Como resposta leva apenas a de que o mundo está cheio de cabrões e cabras e a vida é demasiado curta para a passares a pensar se te deves tornar num ou não, que a mim tanto se me dá, desde que amanhã estejas no Treptower Park à hora marcada. Vou para a cama a pensar que isto é sempre a merda das pessoas erradas ou então, quem me manda a mim ser tão esquisita, mas mais do que isso não penso. Há dias assim, em que não quero pensar muito.

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