10.4.07

Berlinenses II

O Coreano

Trabalhámos juntos durante um ano. Ele fazia o sushi, eu admirava-lhe a perfeição, o cuidado, a generosidade (mais um nigiri para este, mais uma colherada de gengibre para aquele). Sabia ler nos olhos das pessoas os seus gostos, as suas preferências, se gostavam de coisas picantes, se doces, se amargas. Atrás do balcão, quieto, ocupado em cortar e enrolar o peixe, parecia alheio ao que se passava à sua volta, mas apercebia-se de tudo e de todos os clientes que entravam (gostava especialmente dos que se sentavam ao balcão para lhe apreciarem o jeito, lhe tirarem fotografias, lhe perguntarem sobre a sua arte).
Quando não havia muita gente, vinha sentar-se ao pé de mim e pedia-me um cigarro. Começávamos a falar sobre cinema, arte, música, outros restaurantes de Berlim, a comida e cultura asiáticas, até que chegava alguém, nos levantávamos e recuperávamos o tema da conversa depois de todos se terem ido embora, contas feitas, gorjeta para ti, gorjeta para mim, restaurante fechado, e tomávamos o mesmo caminho para casa, de bicicletas pela mão para prolongar o tempo de tagarelice.

Dois anos depois, abriu o seu próprio restaurante. Fui lá, com um amigo, e sentei-me ao balcão para poder falar com ele e observá-lo na mestria da sua arte. Por uns momentos, parecia que apenas a perspectiva era diferente (nunca chegámos a falar seriamente sobre tudo o que mudou).

Numa das muitas sessões de cinema em sua casa, conheci a sua mulher, uma japonesa encantadora, artista. Só mais tarde viria a reparar no seu nome num poster lá de casa (que tinha comprado em Freiburg). Chiharu Shiota. O tema da exposição: Miss.You.

0 Kommentare:

Kommentar veröffentlichen

Abonnieren Kommentare zum Post [Atom]

<< Startseite