17.4.07

Berlinenses III

O inglês

Foi o francês que mo apresentou num dia em que não me apetecia sair de casa. Mais valia não ter saído, fosse eu dotada de dons divinatórios. A verdade é que podia não falar dele, mas não falar nas coisas nem sempre significa que já as esquecemos. Nem que já não nos importam.

Ele até nem era má pessoa. Só um pouco estranho. Um autêntico freak, para ser sincera. Mas eu até lhe achava piada ao princípio. Divertia-me saber que havia pessoas tão fora da realidade e que até não se preocupavam com isso. Divertia-me saber que havia pessoas que penduravam papelinhos nas paredes com passagens da Bíblia e que realmente meditavam sobre o assunto, enquanto pregavam as vantagens da simplicidade e de trabalhar só seis horas por semana para garantir o sustento básico, mas que, no que dizia respeito a, a isso mesmo, ao respeito pelos outros, se esqueciam dos mandamentos do nazareno.
Um dia chegou-me a mostarda ao nariz, fui a casa dele, disse-lhe das boas e só não lhe espetei com a Bíblia no cú porque não encontrei nenhuma à mão. Quando me pediu que continuássemos amigos, ainda lhe disse fuck you, na língua dele que era para que percebesse todas as sílabas. Gostei, senti-me bem. Depois fui-me embora. Peguei nas minhas coisas e não olhei para trás.

Custou-me durante umas semanas, mas hoje em dia já me consigo rir. Porque tenho a certeza de que continua a convidar mendigos para irem comer bolos à casa dele e a autoflagerar-se de cada vez que tem sexo (e que se vem, e vinha-se sempre, por isso é que nunca consegui entender muito bem o melodrama da coisa) e a atirar os amigos ao lago do Tiergarten por pura diversão e a perguntar aos convidados o que é que não gostam de comer para depois fazer exactamente isso para o jantar. A lista só acaba aqui devido a um certo writer´s block, se tivesse legitimidade para sofrer do mal.
No entanto, era giro se um dia o encontrasse por acaso na Kastanienallee. Só para, rindo, ter a certeza de que há coisas e pessoas que vou gostar de deixar para trás.

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